domingo, 15 de dezembro de 2013

“Longe de casa há mais de uma semana”: refletindo sobre saudade



Saudade. Palavra que existe apenas em português. É o que dizem. Sorte dos estrangeiros, que não sentem saudade. Por que é a dor mais doída. E foi sentindo saudade hoje que me deu vontade de escrever, como que para trazer o objeto de saudade de volta perto de mim.

Hoje eu senti saudade de um tempo que não volta mais. Piquenique no parque, dividir brinquedos, casa na árvore, recreio, merenda, disco da Xuxa, sopa de pão, não entrar na piscina por duas horas depois de comer, brincar com as coisas velhas da Vovó Branca, comer amora na casa da Vovó Preta. Que saudade da minha avó! Que saudade dos meus pais, dos meus irmãos. Saudade da minha casa, saudade, saudade.

Por que é que a gente tem que crescer? Sair de casa? Em casa a gente nunca está sozinho. Quando a gente está em casa, o problemas parecem menores e as noites, menos frias.  Longe de casa a solidão parece um abismo sem fim, um deserto, onde as noites tem frio insuportável. Longe de casa se descobre que insônia existe mesmo! E que é horrível acordar tão cedo e não ter ninguém pra conversar, não ter a mãe entrando no quarto e falando que precisa abrir a janela pra entrar um ar, que o pai comprou pão, perguntando o que ela faz de almoço.

Entrei nos arquivos do blog pra escrever outro texto, e me deparei com esse que comecei a escrever meses atrás. Percebi que a saudade só aumenta com o tempo, mas que vai deixando a gente duro, vai cauterizando o coração. E dura é um adjetivo que não quero ter, pelo menos não nesse sentido. Quero olhar pras coisas e pessoas com a mesma singeleza e ternura de tempos atrás. Quero ser capaz de me emocionar, quero acreditar, mesmo que o mundo diga o contrário. Mas isso é assunto para o próximo texto, que publicarei daqui a pouco.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

A Arte do Encontro – Parte Final


Podia jurar que ficou em estado de choque quando a viu. Pensou o dia inteiro que era uma coincidência a agência no mesmo prédio onde trabalhava, mas não imaginava que ela trabalhava ali, muito menos que ela era a gentil pessoa que o havia atendido pela Internet.  Ela olhou profundamente para ele quando entrou, deu boas vindas e apertou sua mão. Então, passou a falar dos detalhes da viagem, das providências a tomar, das formas de pagamento.  Falou entusiasmada sobre Paraty, suas belezas, sua história, os pontos que ela não podia deixar de conhecer. Disse que ele tinha que ir ao cais do porto, falava muito e rápido, parecia desconcentrada, ele não conseguia entender a razão. Pensou que era bom que fosse assim, uma vez que ele estava hipnotizado pela visão de sua musa, o momento que sonhara havia chegado e a verdade é que ele não conseguia dizer sequer uma palavra. Ela era linda, sua voz doce, clara, clara, rouca, seu perfume Versace o deixava inebriado, seu jeito de gesticular, desviar o olhar de seus olhos, a mulher com quem passara sonhando nos últimos meses era tudo aqui que havia pensado e ainda mais. Como uma criança num parque da Disney pela primeira vez, como alguém que vê o mar, ele estava encantado. Quando ela lhe fazia uma pergunta retórica, ele assentia com a cabeça, não sabia bem o quê.

Quando o homem do olhar terno entrou no escritório, dizendo que tinha hora marcada, não conseguia acreditar. Sempre teve vontade de se aproximar daquele homem da joalheria, agora ele estava diante dela. Olhou profundamente para ele e se encantou por seus olhos grandes, castanhos.  Encantou-se por saber que ele gostava de Paraty, ficou encantada com seu jeito tímido de olhar, de falar. Aquele encantamento a deixou desconcertada. Tentou disfarçar falando da viagem, das questões burocráticas, indiciou passeios.  Tinha tanto pra falar, havia fantasiado tantas histórias com aquele homem que conhecia de vista, que namorava de vista, não conseguia dizer.

Quando percebeu, ele estava digitando a senha do cartão, já com as passagens, guias e endereços em mãos, a viagem marcada para três dias depois. Ele conseguiu apertar sua mão, agradecendo pela ajuda. De novo aquele olhar castanho cruzou o seu. Ele sorria com o olhar. O acompanhou até a porta, ficou olhando ele chamar o elevador, entrar, e sumir. Censurou a si mesma por não ter dito nada do que realmente queria a ele, o homem que parecia perfeito para ela.

No elevador, conseguiu, enfim, respirar aliviado. A presença daquela mulher o oprimia. Não conseguia se perdoar por ter deixado aquela chance escapar: por que não a convidou pra tomar um café, caminhar até a esquina, aquela exposição tão aclamada que agora estava na cidade? Por que não disse a ela que sempre sonhou com aquele momento? Que homem era ele, que deixava a mulher de sua vida escapar assim? Ainda sentia o cheiro daquele perfume. Sabia que aquele momento não se repetiria outra vez.

Chegou em casa, anotou num bloco todas as coisas que precisava resolver em três dias, até sua viagem.  Adormeceu ainda se recriminando pelos acontecimentos do dia, não sonhou com ela. Viajou para Paraty, olhou o mar sentado no cais do porto, tomou cachaça no alambique, conheceu as cachoeiras, as ilhas. Comeu tapioca com leite condensado, foi a restaurantes badalados e conheceu belas mulheres. Voltou descansado das férias. Chegou na loja, soube que havia sido transferido. Foi à agência pra agradecer e levar um souvenir, mas ela não estava. Deixou com sua amiga. Tempos depois, conheceu uma mulher inteligente e bonita. Casou-se com ela, mas nunca mais sentiu aquilo outra vez, nunca mais ficou inebriado com nenhum perfume, por nenhuma voz.

Ela passou a atender clientes fora do escritório, raramente ficava na agência. Pouco tempo depois, teve a oportunidade de participar da abertura de uma filial na Espanha. Viajou o mundo, experimentou novos pratos, foi ao cais do porto de muitos lugares, lembrou-se de Paraty. Estabeleceu-se na Espanha, onde aprender a chamar de lar. Leu livros em Espanhol, se apaixonou pelas musicas, aprendeu a dançar. Nunca se casou, vez por outra se lembrava daquele homem do olhar terno, para quem vendera uma viagem a Paraty. A lembrança dele era dolorida, e sempre que vinha, procurava se distrair com alguma tarefa.

Nunca mais se viram. Nunca mais se encantaram por ninguém. Nunca mais mergulharam no olhar de ninguém. Foram felizes, encontraram muitas coisas, lugares, pessoas, sabores, mas desencontraram uns dos outros. É como diz o poeta, lembrei ao ouvir essa estória, “a vida é a arte do encontro, embora haja tanto desencontro pela vida”.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

A Arte do Encontro - Parte II


Trabalhar naquela agência de viagem era necessário. Após decidir viver naquela cidade, longe da família, precisava encontrar meios para cuidar de si sozinha. Aquele não era o trabalho que sonhara desde menina, tampouco era o que ela gostaria de fazer pelo resto da vida, Entretanto, enquanto estava lá, tratava de dar o mais encantador dos sorrisos para os clientes, mesmo por telefone. Fantasiava os motivos que os levavam a viajar e acreditava que de alguma forma, seu trabalho contribuía para um mundo mais feliz e bonito.

Jurou para si que as horas que passasse fora do trabalho seriam gastas com o que ela mais amava. Assim, ia frequentemente ao cinema, cozinhava suas comidas preferidas, enquanto ouvia jazz ou Chico Buarque, escrevia estórias, caminhava e saía com as amigas. À noite, deitava-se e abria um livro, que comprara na última viagem, com o pretexto de se distrair enquanto esperava pelo embarque. “Esse”, jurava, “esse eu vou terminar...”. A verdade é que andava muito cansada e não conseguia terminar de ler os livros, embora amasse comprá-los. Logo a leitura lhe trazia uma lembrança de sua própria vida, ou de outrem, e começava a divagar, em instantes percebia que não conseguiria ler mais aquela noite. Dormia.

Quando o despertador teimava em tocar, despertando-a de seus sonhos, respirava profundamente antes de levantar. Escolhia a roupa, colocava o lanche na bolsa. Se maquiava e passava o perfume. Tinha quatro, mas o Versace era o predileto. Ia para o trabalho, onde dera a sorte de fazer grandes amizades. A hora do almoço era sempre a mais divertida. Sempre haviam histórias a contar e a ouvir. Ia com as amigas a um restaurante natural não longe dali, onde, todas, em dieta, podiam se regalar.

Naquele dia estava cheia de trabalho. A agência havia implantando recentemente um sistema on-line, que permitia aos clientes montar suas viagens pela internet, com assessoria de consultoras, como ela. Malásia, Paris, São Luis, Nova York: Sempre brincava de imaginar quem estava por trás daquelas diversas solicitações. Quando o cliente tinha que ir à agência, pra assinar o contrato ou resolver alguma pendência, conferia para saber se acertara. E era boa nisso! Sorriu ao se deparar com uma solicitação de turismo de aventura para Paraty: era sua cidade preferida, sua especialidade. Prepararia com carinho aquela viagem. O perfil do cliente era interessante: homem, solteiro, há muito tempo não tirava férias. Montou o pacote, enviou para ele. Se surpreendeu quando e resposta veio rapidamente: ele estava inseguro com a compra pela internet, preferia acertar pessoalmente. “Tudo bem”, respondeu. “O senhor pode passar aqui à tarde, que já estarei com tudo pronto para ajudá-lo. Anote o endereço por favor”.

Olhou para o relógio vermelho sobre a mesa: Se distraíra e quase perdera a hora do almoço com as amigas. Uma delas estava especialmente agitada naquele dia, pois havia conhecido o homem de seus sonhos na noite anterior. Ela sorria animadamente. Não era a primeira vez que sua amiga conhecia o homem dos sonhos. Saindo do elevador, reparou que na loja de joias estava, como sempre, aquele homem do olhar terno. Tinha vontade de conversar com ele. Seu olhar revelava uma alma cheia de sonhos, de estórias, de lirismo e paixão. Ele sempre estava ali naquele horário. Ela ficava feliz. Sentia-se bem de olhar para ele. Sorria com os olhos. “Se ele pelo menos trabalhasse numa loja de livros...” pensava, “mas para joias eu não tenho dinheiro, se não, iria até lá: só para falar com ele”. Naquela tarde seus olhos pareciam brilhar mais intensamente. “Estou ficando louca”, pensou, e se distraiu novamente com a amiga e seu homem dos sonhos... Às cinco tinha que que atender ao cliente que ia para Paraty. Pensou na viagem. Por um instante, se imaginou com  o homem da loja de joias, sentada no cais do porto de Paraty, seu lugar preferido no mundo. “É... devo mesmo estar louca. Preciso trabalhar...”
 Link para a primeira parte

terça-feira, 9 de julho de 2013

A arte do encontro – parte I



Olhou o relógio ansioso: Faltavam exatos catorze minutos. Todos os dias o ritual se repetia: passava as manhãs contando os minutos, torcia para que houvesse bastante movimento, na loja de joias onde trabalhava, para que o tempo passasse mais depressa. Organizava as vitrines mas de uma vez, fazia contato com clientes importantes, mexia nas gavetas.
 Há cinco anos trabalhava ali. Há quatro meses, se deliciava com aquele pequeno instante de prazer: Sempre ao meio dia e cinquenta e cinco, quando ela descia com duas amigas, pelo elevador do meio, vindo de não se sabe que andar. Conversando animadamente com as amigas, ela passava diante da loja, que ficava no saguão daquele imenso edifício, sorria e ia embora, voltando cinquenta minutos depois, entrando no elevador e desaparecendo outra vez. Ele absorvia cada nota de seu perfume, um Versace, viera saber depois de ir à importadora e experimentar dezenas de fragrâncias. Ele viajava na melodia de sua voz, clara, ainda que um pouco rouca, com um tom meigo e conciliador, divagava sonhando em ficar horas e horas conversando com a dona daquela voz. Já havia decorado a cor do cabelo dela, bem como suas roupas preferidas. Deslumbrava-se quando ela, tímida, olhava para baixo e colocava a mecha de cabelo atrás da orelha. Seria capaz de acertar os dias em que ela estava mais feliz, bem como aqueles, que ela parecia não sorrir com o mesmo entusiasmo. Aquela aparição diária iluminava seus dias. Ia se apaixonando por aquela mulher, com quem jamais havia trocado uma palavra.
A primeira vez aconteceu por acaso. Uma nova coleção havia acabado de chegar e ele conversava com os vendedores, sobre como haviam conseguido dispor aquelas joias, chamando a atenção dos clientes mais desatentos. Foi quando a imagem dela surgiu diante dele: sorridente, na companhia daquelas amigas. Vestia uma calça jeans desbotada e uma blusa vermelha. Deduzira um tempo depois que aquela era sua cor favorita, pois se repetia nos acessórios, brincos, na bolsa que ela usara certo dia.
Sonhava falar com ela, perguntar seu nome, dizer o quanto a admirava. Queria pedi-la pra tomar um café, ou outra coisa, um dia desses, mas não conseguia. A imagem dela o hipnotizava, paralisava seus reflexos, o enchia de deslumbramento e mais nada.
Há dois anos não tirava férias e o chefe já havia dado um ultimato: daquele mês não podia passar. Tinha que pensar no que fazer aquele mês de descanso, pensava em viajar, queria ir para Paraty, mergulhar em Angra. Mas já imaginava quão cinzas seriam seus dias sem ver sua musa. Aquela noite, começou a pesquisar na internet os detalhes de sua viagem. Descobriu uma agência virtual, especializada justamente em Turismo de aventura, com pacotes especiais para aquela região do Rio de Janeiro. Acabou se distraindo: escolheu hotel, alugou carro, definiu passeios e roteiros. Agora era só submeter suas escolhas à agência, e em vinte e quatro horas, dizia o anúncio, teria um retorno do agente. Estava cansado: Já eram duas da manhã quando se deitou e foi nela que pensou antes de adormecer.

Obs.: A parte dois e a parte três saem ainda essa semana.

sábado, 29 de junho de 2013

Me perguntaram por que não vou aos protestos...





Meu pai me bateu três vezes quando eu era criança. Parece pouco, mas se comparado aos meus irmãos, que nunca apanharam dele, talvez seja possível ter uma ideia de como eu sempre fui atrevida e brigona. A ocasião que mais ilustra isso é quando eu, por volta dos três anos, chutei meu irmão de uns quase dois para fora do sofá. Afinal, eu queria defender meu espaço! Meu pai me deu um tapa e eu não fugi, como fiz a vida inteira, aliás. No colégio, era sempre aquela que fazia pergunta pra criar polêmica. Em casa, idem. Sempre questionei tudo.
Uma pessoa próxima disse que não entende porque eu não estou participando desses recentes protestos que acontecem no Brasil. Imagino que a surpresa vem do fato da pessoa em questão saber o quanto eu gosto de política, de defender direitos meus e dos meus, o quando eu odeio a injustiça. Ora, a história de chutar meu irmão pra fora do sofá quando era tão pequena, me faz pensar que sempre fui assim. A própria vida tratou de reforçar essa característica. Eu poderia ir pra rua empunhando um cartaz pedindo melhores condições de saúde, pois já tive que madrugar para conseguir marcar uma consulta. Poderia também pedir por melhores escolas e professores, porque já passei por inúmeras greves, porque  já sofri com professores incompetentes, que davam aula pra complementar o orçamento, mas não amavam o que faziam. Condições de transporte, então? Quantas vezes já mofei duas, três horas no ponto indo pra Betim, quantas vezes tive que dormir na casa dos outros porque não tinha mais ônibus, quantas vezes cheguei atrasada no trabalho, na faculdade, por problemas no ônibus ou no metrô? Quantas vezes fui vítima de preconceito por ser pobre? Por morar na periferia? Portanto, se fosse às manifestações, não falaria de coisas das quais ouvi falar. Falaria com conhecimento de causa.
 Nunca me filiei a nenhum partido, mas sempre gostei da esquerda e, embora tenha uma grande lista de reclamações a fazer da administração do PT de 2002 para cá, sou muito mais orgulhosa do bem que esse governo tem feito ao povo que mais precisa, ao povo do qual eu faço parte. Mas não é por isso que não tenho participado.
Tenho visto bastante a expressão “não me representa”, ostentada com orgulho por muitos “ativistas”. E o motivo pelo qual me abstenho até aqui de participar é que não me sinto representada pelo povo que vai às ruas. Porque, vejam bem:
- Eu não acho que a Dilma esteja F*#$n%* o Brasil, como escutei outro dia na Afonso Pena
- Eu não sou contra a copa. Nunca fui. Sou Turismóloga e entendo que um evento dessa visibilidade vai trazer grandes benefícios para meu país. Acho inclusive incoerentes esses protestos contra a copa, porque quando o Brasil foi anunciado como país sede, milhões e milhões de brasileiros comemoraram o fato.
- Sou totalmente contra a corrupção. Por isso, aliás, nunca tive carteira de estudante falsa, nunca deixei transferirem pontos para minha carteira, nunca lesei ninguém. Entretanto, tenho excelente memória. E sei que os líderes do movimento de agora fazem parte de uma direita que há anos vem extraindo toda riqueza desse país, deixado os pobres na penúria, desviando verbas, superfaturando obras, enriquecendo suas contas em paraísos fiscais, privatizando a preço de banana nossas maiores riquezas. Não me sinto a vontade para me juntar a eles.
- Amo a democracia, amo debater ideias, e tenho visto como algumas minorias e grupos como sindicatos e partidos, por exemplo, tem sido hostilizados nesses movimentos.
- Sou contra a violência. Os manifestantes, ao mesmo tempo que pedem à polícia para não ser violenta, batem nos integrantes de partidos, provocam a polícia, destroem o patrimônio público e privado. Outro dia, numa página de um desses inúmeros eventos que são marcados no Facebook, um grupo pedia a polícia para se preparar para um ataque de bolas de gude. Não foi a Globo que falou. Foram eles mesmos. Não posso compactuar com isso.
Esses protestos parecem um emaranhado de tudo que eu disse acima e mais um pouco. Me sinto confusa e, sobretudo, não me identifico com esses manifestantes.  Não gosto de preconceitos e penso que não se combate o preconceito com mais preconceito. Não me sinto, enfim, representada por esses manifestantes.
Tenho amigos que estão participando e reconheço neles uma vontade genuína de mudar o país. Talvez, por essas pessoas, eu mude de ideia e participe. Aliás, mudar de ideia é tudo de bom! Mas diante de tudo o que acabei de dizer, penso que talvez seja incoerência da minha parte participar. Se o fizer, será num movimento particular, com minhas próprias demandas, com minhas próprias bandeiras, com a minha luta. Não sei se seria reconhecida como parte do grupo de manifestantes, mas talvez, como brasileira, que amo ser.
Só gostaria de registrar que estou muito feliz que a política tenha tomado conta das discussões nas mesas de bar, nas academias, na Internet, nos pontos de ônibus! Orgulhosa dos brasileiros!

sábado, 15 de junho de 2013

Minha casa é o melhor lugar do mundo...



Meu pai é calado, mas sempre consigo perceber sua presença em casa. Ele dá comida aos cachorros, escuta música. Conta para minha mãe as piadas que lê no jornal. Ele compra cebolinhas em conserva desde que descobriu que eu gosto, assim como compra frango pra agradar ao Wendell e pão de queijo para minha mãe. Ele sempre me pede pra pagar as contas pra ele. Sempre em cima da hora. Ele assiste calado aos jogos de futebol: se o time dele ganhar ou perder, não importa: meu pai fica caladinho. Meu pai tosse muito de manhã e eu escuto do meu quarto. Ele toma remédio todo dia antes de ir dormir. Eu odeio, mas ele fuma escondido. Eu amo chegar em casa e ver ele no sofá assistindo TV. Eu amo ouvir ele contando piadas. Sinto toda ternura do mundo olhando para meu pai.
Minha mãe faz qualquer comida ficar gostosa, até com cebola. Ela sempre entra no meu quarto e diz que tenho que abrir a janela, pra renovar o ar. Minha mãe sempre me interrompe quando estou assistindo filme e não entendo porque isso me irrita. Eu quase não a vejo durante semana. Quando chego, ela já foi dormir, saio antes de ela se levantar. Mas sempre tem um bilhetinho, dizendo que tem salada na geladeira, que minha marmita é a de tampa verde, que me ama. Minha mãe sempre implica com a minha roupa, mas sempre fala bem de mim pras amigas dela. Minha mãe sempre me fala a coisa certa, na hora certa. Quando eu to chorando, ela sabe o porquê, mesmo que eu não fale nada. Minha mãe mima mais o Frejat (o gato) do que a mim. Minha mãe fica cantarolando as músicas que eu estou ouvindo. Minha mãe conversa horas no telefone, sempre dando conselho pra todo mundo. Minha mãe fica irritada quando eu digo que ela prefere o Chris. Eu sei que ela me ama igual – e ao Wendell também, mas acho divertido deixar ela nervosa. Minha mãe é a mulher da minha vida.
O Wendell fica só no quarto dele, conversando com mil amigos na Internet. Acho que ele é popular e querido. Não é para menos, afinal, sempre soube que ele era um homem bom. Às vezes, quero dormir e ele está conversando na Internet e eu não consigo. Ele sai do quarto só pra fazer comida. Sempre um prato diferente. Quase sempre fica bom. Digo quase porque ele não gosta muito de sal, como eu. O Wendell é romântico como a irmã. E tem fases de músicas: Milton, Clara Nunes, Legião. No quarto dele tem mais livro que no meu. E pensar que eu dava dicas de livros pra ele. Ele me odeia por não gostar dos cachorros, mas sempre me ajuda quando preciso. Ele também sabe quando tô triste e tem um jeito pra me consolar. Ele escuta minhas confissões amorosas (ou não!) e conta pra mãe. Eu nunca aprendo. Ele sempre está no banheiro quando quero tomar banho. Ele sempre coloca cebola na comida quando não quer dividir comigo. Ele sempre leva as coisas que eu esqueço até o ponto de ônibus. Quando já me deitei, chamo-o pra apagar a luz pra mim. Ele morre de raiva disso, mas sempre faz. Ele é minha versão masculina, mais nova. Me vejo olhando pra ele.
O Chris tem um nome difícil. Pra mim, ele é só Chris, meu companheiro de infância, de histórias alegres e tristes. O Chris, desde o casamento, é uma ausência presente. Quando tem a comida que ele gosta, quando tem que consertar as coisas, quando passa o Cruzeiro na televisão, nos álbuns de nós dois pequenininhos. O Chris é uma ausência que dói. O Chris é uma alegria quando vem em casa.
Agora, prestes a sair daqui, não consigo imaginar como fazer sem eles.

quarta-feira, 24 de abril de 2013

“All you need is love!”





Mais uma vez, a inspiração para escrever veio de uma amiga. Sou afinal, uma pessoa afortunada por ter de Deus os melhores amigos que poderiam existir nesse mundo. Essa amiga é uma dessas dádivas na minha vida. Uma pessoa destinada a ser rotulada desde o nascimento: filha de pais mais velhos, mimada, patricinha, enjoada. Por que as pessoas insistem em rotular os outros, em vez de conhecê-los? Nesses dias chatos que vivemos, quando não se pode ter uma opinião*, lendo o artigo do tal francês lembrei-me da minha amiga. Ele fala do amor com rótulos e talvez não tenha percebido ainda que brasileiro adora rotular.
É o caminho mais fácil: é melhor dizer que não vai ao Rio porque é violento e pronto. É melhor dizer  o Brasil é o país dos corruptos e que o funk é de cultura inferior. Rotulando, não precisamos questionar. É assim e pronto. Rotulando, trilhamos o caminho da intolerância, que não admite o diferente, que se julga superior, ou inferior. Rotulando, não temos trabalho. Rotulando, perdemos um mundo de possibilidades.
Por isso me lembrei da minha amiga, pensando nesses rótulos todos, no que disse o francês, no que dizem os gays e no que diz o Feliciano e companhia, lembrei-me dela. Porque foi numa disposição de nós duas em recusar todos os rótulos, que vivemos juntas momentos inesquecíveis para sempre, que construímos uma amizade que é como uma vara, que se agita e se dobra com o vento, mas não se quebra. Eu a "crente", ela a "espírita" - ou seria “agnóstica”? Palavra que ela aprendeu e adorou, eu a “trabalhadora assalariada”, ela a "patricinha", ela a "delicada", eu a "sem noção" e por aí vai. Desde o início, graças a Deus, ignorei todos os rótulos que ela ouviu por tantos anos. Penso que ela também. Afinal, duas pessoas tão diferentes entre si precisavam ter pelo menos algo em comum e nós tínhamos: o desprezo pelos rótulos. No final saímos ganhando: eu ensinei a ela como fazer molho de macarrão e ela, que não se come a casquinha do pistache. Aprendi a diferença entre blush e rímel, e ela, bem, eu não sei. Sempre acho que estou em débito com alguma coisa. Fato é que nesse exato momento, se eu desmaiar nesse metrô agora e alguém perguntar, darei o número dela e ela virá. Se ela estiver do outro lado do mundo e alguém partir meu coração, é pra ela que vou ligar. E eu sei que se ela estiver com medo de dormir sozinha em casa, se passar mal, se resolver casar, mudar, ela vai me chamar. E eu vou. Me lembro de quando aprendemos juntas sobre oque é uma pessoa livre, ficamos encantadas. Penso que nessa amizade conseguimos nos aproximar desse conceito. Penso no quanto demos sorte de nos encontrar, naquele distante fevereiro, e nos abrir ao mesmo tempo pra esse mundo de possibilidades, que reverberou e cresceu todos esses anos.
Essa menina minha amiga sabe o quanto detesto servir de modelo ou exemplo pra o que ou quem quer que seja. Mas resolvi escrever aqui um pouquinho dessa nossa história, para ilustrar esse mundo de possibilidades do qual falei, que se abre quando recusamos os rótulos, os pré-conceitos, e nos abrimos para o novo. Como um apelo para meus amigos e poucos leitores: sejam menos chatos, menos intolerantes: abram-se para conhecer o novo, o diferente. Tente ter uma atitude mais leve diante das situações. Lembrem-se, todas as manhãs, que o diferente não é pior, nem melhor. É apenas o que é: diferente. E pode ser até interessante, como comer pão com tomate, ou ir numa micareta (pelo menos pra dizer que não gostou).
É tão bom conversar com alguém que não tem "aquela opinião formada sobre tudo"! É tão bom conversar com alguém que sabe ouvir e também sabe falar. Alguém que pega os rótulos e lança ao vento.
Foi o que minha amiga fez. Ainda bem, contra todos os rótulos, conhecemos o mundo. Eu o dela e ela, o meu. De repente, vimos que ele nem é tão diferente assim, e que afinal, o amor é o que realmente importa, e que responde efetivamente a toda intolerância.
Ah... Se for pra fazer um rótulo, faça uma tatuagem!


P. S.: eu odeio funk e axé. Mas já fui para o baile, e também para a micareta. Com ela, claro, que também queria ir comigo ver o Paul...
*Hoje, relendo o texto 6 anos depois, posso dizer que continuamos amigas. De fato ela casou e me chamou pra madrinha. E mais importante: há seis anos eu entendia que o mundo estava ficando chato porque as pessoas estavam reclamando de certas "opiniões" . Hoje eu quero que mais gente reclame mesmo, quando as opiniões servem para oprimir, para diminuir, pra humilhar, subjugar e manter o status quo de uma minoria que detém o poder. Minha amiga concorda comigo.

Voltei. Tava com Saudade.

Hoje eu voltei. Voltei porque senti saudade. Saudade do tempo que eu podia chorar no seu ombro as minhas mágoas, filosofar minhas ide...