sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Estar Só

“Solidão é lava que cobre tudo...”1
Desde menina, Beatriz sempre teve facilidade de ficar longe das pessoas que ama, pra viver coisas diferentes e explorar o mundo ao seu redor: No início, esse mundo ao redor era simplesmente a casa de suas avós e tios, depois, a casa das amigas. Com dezenove anos fez a primeira viagem sem nenhum “adulto” por perto: Poderia decidir onde e quando ir, quanto gastar, quando voltar. Depois dessa vieram muitas outras viagens e estar sozinha nas viagens foi algo que sempre a agradou. Também gostava quando, sozinha em casa, sabia que uma hora alguém chegaria, mas enquanto isso não acontecia, ouvia música alta, ficava à vontade, dormia sem ser acordada de repente e amava tudo isso. Durante sua vida escolar, trabalhos e provas sozinha eram os seus preferidos. Nunca parou para pensar nessa simpatia pela solidão. Até que a solidão chegou de um jeito que ela não podia mais controlar.
O tema começou a perseguí-la. Estar sozinha não era mais uma questão de escolha. Ao constatar que estava sozinha e não poderia mudar isso se assim desejasse, teve medo. Medo de ficar para sempre longe de quem ainda amava, medo de encarar a si e não gostar do que via, medo de que aquela solidão, como um monstro incansável e persistente, acabasse por destruí-la.
Quando entramos no cinema e o filme já começou, a escuridão da sala cega ao ponto de mal conseguirmos encontrar um assento vago. Nessa hora, é preciso paciência de esperar que os olhos se acostumem com a luz ambiente para conseguir discernir as figuras das poltronas, das pessoas, e mesmo os corredores e escadas. Aí, vemos que aquele ambiente, antes assustador, é, na verdade, acolhedor e confortável.
Beatriz experimentou sensação parecida ao se ver sozinha: Primeiro,  sentia apenas pânico.  Mas, aos poucos, percebeu que aquela temporada de solidão poderia lhe render bons frutos. Foi nessa época que se conheceu como nunca antes. Foi também quando pode fazer um balanço de tudo o que havia vivido, e quando teve a oportunidade de se abrir para histórias que jamais havia imaginado viver. É como uma frase que leu certa vez: “As cosias que realizamos, não são tão lindas quanto às que sonhamos, mas, às vezes, nos acontecem coisas tão maravilhosas, que pensamos que jamais poderíamos sonhá-las”. E foi isso que pensou Beatriz, em lua de mel consigo mesma.
Ainda sentia falta dos tempos que não andava só. Às vezes chorava. Mas seus olhos continuavam brilhantes e abertos na expectativa das descobertas e caminhos à sua frente. Se ela mudou? “É claro”, ela diz. Estava mais madura, mais serena. Mas sua essência, sua raiz, continuava a mesma, afinal, já disse o sábio mais sábio da história: “Porventura colhem-se uvas dos espinheiros, ou figos dos abrolhos?”2



1 – Paulinho da Viola – Dança da Solidão
2 – Evangelho Segundo Mateus cap. 7: 16.

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Prometo

Aprendi que não se deve prometer quando não se pretende cumprir. Eu mesmo já me senti traída quando fizeram isso comigo. Mas vamos lá, menos drama: Prometo que escreverei um novo texto para o blog ainda essa semana. Estou cheia de ideias, mas é que nesse final de ano não tenho parado em casa. Cada dia é uma confraternização, amigo-secreto, compra de Natal... rs... Agora acho que acabou. Por isso, PROMETO que postarei algo essa semana. Não tenho tantos leitores assim, muito menos qualquer interesse comercial, mas escrever para mim é uma terapia que já está fazendo falta. Então, volto já! Abraços a todos!

domingo, 27 de novembro de 2011

Chapeuzinho Vermelho, Rita Lee e Eu

Tem uma hora na vida que todo mundo para, pensa e se pergunta, tal como em João e Maria, “o que é que a vida vai fazer de mim?”¹ Todo mundo tem um ideal. E esse ideal depende de seu dono. Não é possível dizer o que é mais ou menos nobre ou ousado. Fato é que após se fazer essa pergunta, algo diferente acontece. Pode-se perceber que se está longe daquele ideal, que é preciso dar uns passos atrás, ou à frente na busca daquilo que, no íntimo, sabe-se ser realmente importante.

Uma estória conhecida diz a respeito de uma menina que um dia, incentivada pela mãe, foi sozinha pela floresta levar doces para a avó. Ao se ver sozinha naquela floresta, talvez ela tenha se feito essa pergunta. E foi quando percebeu que a decisão era dela, e quão assustador pode ser perceber que se é o único responsável por uma vida inteira! Seus fracassos e sucessos, suas angústias e alegrias. O mundo ao redor, a floresta, nessa hora podem aparentar mais escuros que realmente são. Voltar atrás é possível, voltar para a casa da mãe. É possível também ir para frente, mas são tantos caminhos! Nessa hora, apareceu alguém para dar um conselho, e a inocente menina, acredita que aquele conselho não poderia ser melhor. Não se pode culpá-la, afinal, é só vivendo que se aprende a viver, ou, como diz o poeta, “amar se aprende amando”4. Como a menina saberia que ficaria mais perdida que já estava? Que as consequências daquela decisão reverberariam por um bom tempo? Agora ela estava perdida na noite da floresta, ou, se não estava perdida, pelo menos demoraria mais tempo para chegar ao seu destino, do que se seguisse o plano inicial. No entanto, não aprenderia lições que só aquele caminho proporcionaria.
Tal como em “Ovelha Negra”², da Rita Lee, uma das minhas canções preferidas. “...É a canção de quem foi “convidado” a sair de casa e teve que enfrentar o mundo hostil à sua frente para poder concretizar seus sonhos e defender suas convicções”³ (Rolling Stone, 2009). Essa canção poderia ser a canção de Chapeuzinho Vermelho. Diz a reportagem que esse foi o primeiro sucesso solo da Rita Lee. Não poderia vir mais a calhar: Afinal, ela estava “perdida, procurando se encontrar” após a saída dos Mutantes e acabou se tornando a Rita Lee, que tanto admiro. Não se sabe quão duro foi o caminho até ela “se encontrar”. Na verdade nem se sabe se ela já se encontrou. O caminho de cada um é solitário. E tem peculiaridades que só o dono daquele caminho sabe dizer.
Se Chapeuzinho Vermelho existisse e conhecesse a música, a escolheria para si. Como eu escolhi. Olho a floresta ao meu redor e às vezes penso que estou perdida. Por outro lado, já sei de coisas que mais ninguém sabe. O caminho que ficou para trás me mostrou coisas que só no final, com o distanciamento necessário, poderei dizer o que foram e o que significaram. Um dia e um passo de cada vez, ora devagar, ora correndo, procuro seguir para o alvo. Olhar para o lado, para o caminho alheio, é uma tentação a ser evitada. O mundo é grande, assim como a floresta de Chapeuzinho. E, enquanto estou aqui a refletir sobre essas coisas, bilhões de “chapeuzinhos” estão a procura da casa da avó, com a certeza de que não existe caminho melhor.

 

1 – Chico Buarque, João e Maria - 1990 (ao vivo)
2 – Rita Lee, Ovelha Negra – 1975
3 – Rolling Stone, Outubro de 2008
4  - Carlos Drummnd de Andrade, 2001, editora Record
5 - Imagem Retirada de http://colaemmim.com/2011/01/14/a-garota-da-capa-vermelha/


sábado, 12 de novembro de 2011

Gavetas, caixas e algo mais

 Hoje é dia de guardar as roupas no armário. Tal tarefa não é nem um pouco penosa para mim: Não sei por que, adquiri o hábito de nunca deixar meu armário bagunçado. Sendo assim é só chegar com as roupas que acabei de passar e colocar cada uma no seu lugar. As blusas de malha coloridas possuem sua gaveta, bem como as pretas ou brancas e a lingerie, não esquecendo as roupas de ginástica e os pijamas. Os cabides são organizados num “tom sobre tom” que às vezes chego a pensar que tenho TOC! Sou uma alucinada com gavetas, caixas e repartições. Acredito que já dei algum tipo de caixa para quase todas as minhas amigas. Adoro organizar as coisas. Os CDs, na estante em ordem alfabética e os livros em ordem de tamanho, “para ficar mais bonito”, costumo dizer para mim mesma. 

Alguém que não conheça muito bem esse meu mundo particular, pode vir a acreditar que é tudo essa perfeição. Entretanto, ao se adentrar um pouco mais nesse mundo, pode-se perceber que há meses venho adiando a arrumação “caixa de contas”, que é como chamo a caixinha que guarda a caderneta de anotações, cheques e cupons fiscais. Sei que vou gastar horas com aquela tarefa e que não será nada fácil mensurar todos os gastos. Entender e controlar minha vida financeira. Não sei se já li em algum lugar, ou se desenvolvi a teoria sozinha: Penso que todo mundo tem seu lugar de caos, de desordem, por mais organizado que seja. Pode ser uma gaveta, um cômodo da casa, uma área de sua vida. No meu caso, é a caixa de contas. Olho para ela, para os boletos, comprovante de pagamento e faturas que vão se acumulando, e adio a arrumação para o próximo final de semana. No mais, tudo organizado: Por espécie, cor e tamanho. Na vida também poderia ser assim.
São tantos aspectos que compõem o que chamamos que vida: tem a fé, a família, a amor, a profissão, a cultura, os sonhos. Seria bom se a vida fosse um grande armário cheio de gavetas. Assim, poderíamos organizar tudo, separar por cores, bem como privilegiar as partes que mais gostássemos, deixando nas gavetas mais acessíveis, bem como deixar certos assuntos guardados em gavetas bem afastadas, para que só fôssemos mexer quando fosse para arrumar, ou para jogar fora, como se faz com os comprovantes de pagamento antigos.
É. A vida e mais complexa que isso. Entretanto, hoje, às voltas com vestidos, calças jeans e camisetas, decidi agir como se fosse assim mesmo um armário: Vou cuidar da minha fé, da minha profissão, da minha família, do meu sonho de conhecer Londres. Outras coisas vou guardar numa gaveta bem alta do meu coração. E só quando eu estiver inspirada, quando eu souber o que fazer com aquilo, volto a mexer nessa gaveta. Daí, minha vida vai ser mais organizada, assim como meu armário.

Além disso, ao cuidar das outras gavetas, posso aprender coisas novas que me ajudarão depois, quando enfim encarar aquela que deixei de lado por um tempo. Mexendo em outras gavetas, posso de repente perceber que superestimei a importância daquela outra, ou que ela é mais importante que eu pensava, e não consigo viver sem mexer ali. De uma forma ou de outra, há inúmeros assuntos, e inúmeras gavetas para cuidar. Não é possível ficar só andando em círculos em volta de apenas uma, ainda mais quando não se sabe o que fazer com seu conteúdo.

domingo, 23 de outubro de 2011

Uma tarde chuvosa

Ao acordar, teve a sensação que o dia lhe reservava algo diferente. Com aquela sensação foi para o trabalho, onde nada demais aconteceu. Vez por outra, entrava na internet e não via nada de interessante, estava inquieta, procurava algo, mas não sabia o quê. Seu coração estava apertado, como confidenciou a uma amiga, mas não sabia explicar. Um cinema depois do trabalho? Talvez fosse bom para relaxar. Ou não seria melhor ir para casa se esconder do frio e do mundo embaixo das cobertas? Acabou por decidir pelo cinema, mas o filme escolhido, mesmo sendo ótimo, só fez aumentar aquela melancolia.
Tivera uma semana difícil, em crise com a idade, com a profissão, a conta bancária. Olhava para o espelho sem saber se poderia se orgulhar daquela imagem refletida. Os anos passaram, amigos vieram e foram embora, viajou, sorriu, chorou, tomou sex on the beach e comeu gorgonzola, aprendeu, esqueceu. Ao olhar para o espelho, vê em cada expressão todas essas histórias registradas. Sabe que tem algum valor, mas nesses dias chuvosos, fica difícil defender esse valor perante um mundo que outrora lindo e cheio de oportunidades, parece agora assustador, predador. Está refugiada em si mesma, olha para fora e sabe que precisa sair, mas não sabe se conseguirá. Já disseram para ela, não poucas vezes, como ela é forte. A Bíblia, livro no qual tem sua vida embasada, de onde também recebeu muitas promessas, também diz para ela ser forte.
À saída do cinema, um imenso mural, onde as pessoas têm afixado seus pedidos para o Papai Noel, até o Natal, a detém por um instante. Começa a ler os pedidos das pessoas: “Eu quero passar na UFMG”, “eu quero ser um bom advogado”, “quero saúde e paz para o mundo”, “quero uma piscina de vodca”, “quero Fulano”, “eu quero um carro novo”, acha graça de uns pedidos, se emociona com outros.  De alguma forma, aqueles pedidos a fizeram perceber, ou relembrar, que cada um tem sua história, nem melhor, nem pior, apenas diferente. Cada um está correndo para alcançar aquilo que valoriza e que ela precisa fazer o mesmo. Onde esse caminho vai dar? Ainda não sabe. Tampouco sabe o quanto sofrerá ainda antes de dizer que está satisfeita. Mas sabe que nada mudará enquanto ficar ali, dentro de si. Por isso, resolve sair.
Vê que o caminho é duro de fato, mas não é impossível de ser trilhado. Tantos outros já conseguiram! Aquele aperto no coração do início do dia continua. Mas ela decidiu usá-lo como força motriz até que encontre o que está procurando. Sabe que estar insatisfeito é um bom começo para ir em direção do que realmente vale a pena. E é isso que ela vai fazer.

Voltei. Tava com Saudade.

Hoje eu voltei. Voltei porque senti saudade. Saudade do tempo que eu podia chorar no seu ombro as minhas mágoas, filosofar minhas ide...